Desportuguesar

Felizmente, saiu de moda. Mas desportuguesar já se usou muito, em Portugal.

Desportuguesar está por retirar a naturalidade portuguesa a alguém que em Portugal nasceu. Uma impossibilidade lógica. Uma realidade política. Um absurdo. 

Ou, como diria o meu protagonista em A Janela do Cardeal (aproveitando eu a expressão idiomática em língua inglesa, queixando-se ele de ter sido vítima de tal): um sino não se pode destocar.

No tempo do rei D. Manuel de Portugal houve muito desportuguesamento. O mais famoso é produto da expulsão de Portugueses de religião judaica. Mas, a meu ver, o mais embaraçoso foi o de Fernão de Magalhães.

Fernão de Magalhães nasceu no norte de Portugal continental, em Sabrosa, no Alto Douro. Era cidadão do Porto. Esteve na Índia. Foi maltratado na Corte de Lisboa. Emigrou para Sevilha. Daí partiu, desportuguesado, para dar a primeira volta ao mundo. 

A parte do Fernão Magalhães ter sido desportuguesado é tão embaraçosa que, obviamente, vem normalmente omitida. Ao fim e ao cabo trata-se de um dos Portugueses mais ilustres de sempre. Todos compreendemos que não se pode destocar um sino.

As narrativas de viagem que até nós chegaram, acompanhadas do picante do desportuguesamento, vêm largamente explanadas em língua inglesa num delicioso livro de Lord Stanley of Alderley publicado em Londres, em 1874, pela Hakluyt Society, a sociedade de exploradores (de que já fui sócio): The First Voyage Round the World by Magellan.

As provas da naturalidade e do desportugueamento de Fernão de Magalhães, com embaraçosas cartas dos nossos embaixadores ao rei D. Manuel, recolhidas na Torre do Tombo, encontram-se nesse livro, hoje no domínio público (Aqui).

Luis Miguel Novais



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